Muito orgulho e lutas contínuas

28 de junho de 2024 - 0 min pra ler

Há 55 anos, em Nova York, nos Estados Unidos, lésbicas, gays, bissexuais, transgêneros, travestis, queers, intersexo, assexuais e demais pessoas com variabilidade de gênero ou de orientação sexual (LGBTQIA+) resistiram à intolerância e à violência policial. A reação acabou por converter-se em um dos principais marcos da luta desses grupos minorizados por seus direitos e motivou a instituição do mês (junho) e do dia (28) em que eles manifestam, de forma ainda mais contundente, seu orgulho de serem quem são e pelas conquistas por reconhecimento, segurança, respeito e equidade.

Apesar de importantes avanços gradualmente incorporados a legislações e comportamentos em muitos países (como o direito ao casamento e estabelecimento de leis que punem o crime de homofobia), há ainda um longo trajeto a percorrer para dissipar preconceitos e injustiças.

Mesmo em meio a uma escassez de dados oficiais, pesquisas variadas indicam que pessoas LGBTQIA+ convivem com uma série de obstáculos e discriminações em diferentes contextos. Estima-se que o Brasil, por exemplo, seja a nação mais homotransfóbica do mundo. De acordo com informações apuradas pelo Grupo Gay Bahia, só em 2023 foram 257 mortes violentas contra pessoas LGBTQIA+. Também é recorrente o advento de pautas conservadoras no meio político que tentam impedir a conquista de novos direitos ou eliminar os já alcançados.

Outro âmbito em que o preconceito contra LGBTQIA+ se manifesta é o do trabalho. Em março de 2024, o Pacto Global Brasil, vinculado à Organização das Nações Unidas (ONU), apresentou os dados qualitativos de uma primeira fase do Censo de Inclusão Produtiva, que aborda a empregabilidade e o empreendedorismo desses grupos no país. As informações preliminares indicam que a não aceitação das famílias, com possíveis expulsões de casa, interfere nos níveis de abandono escolar e de capacitação dessas pessoas. Apontam também a existência de barreiras, visíveis e invisíveis, em processos seletivos, além de dificuldades de convívio e carreira no mercado formal após a contratação. Diante disso tudo, ter um negócio próprio acaba sendo a opção mais viável para muitos. 

Apoio ao empreendedorismo na comunidade LGBTQIA+

Nesse cenário, a Besouro contribui para estimular a diversidade no âmbito do trabalho, bem como para auxiliar no desenvolvimento de competências entre pessoas LGBTQIA+ interessadas em abrir seus negócios.

Em 2023, a organização realizou o projeto Mais Diversidade, em uma parceria com a Secretaria Nacional da Proteção Global, do Ministério das Mulheres, da Família e dos Direitos Humanos. A ação beneficiou 280 pessoas com capacitações em hotelaria e turismo, operador de caixa, atendente de farmácia, técnicas de vendas e empreendedorismo, além de estimular debates para combater preconceitos e abrir portas a esses públicos nas comunidades e no mercado de trabalho. Já no programa Gerdau Transforma, que a Besouro realiza em conjunto com a gigante brasileira da siderurgia mundial, são constituídas turmas dedicadas especialmente a LGBTQIA+.

Turma do projeto Mais Diversidade_2.png
Turma do projeto Mais Diversidade

Outra iniciativa que contou com o apoio da Besouro foi um curso dedicado exclusivamente a pessoas LGBTQIA+ como parte do programa Empreenda Rio, ação conduzida em parceria com a Prefeitura Municipal da capital carioca. Jéssica Silva, coordenadora de projetos da Besouro, ressalta o papel do empreendedorismo na vida dessas pessoas: “O empreendedorismo é muito importante para esses públicos, porque ajuda na inclusão social, no combate à discriminação e cria oportunidades. O mercado de trabalho ainda é muito ligado a estereótipos. Então, aqueles que integram esses grupos minorizados, ao conduzirem seus próprios negócios, criam autonomia, empoderam-se, ganham mais visibilidade e ampliam a diversidade em diferentes áreas. Muitos empreendedores LGBTQIA+ acabam por incluir pessoas que não o são em seus empreendimentos, e essa mistura também ajuda a eliminar preconceitos”, descreve.

Ao todo, 31 pessoas participaram da turma Arco-Íris, em que tiveram contato com a metodologia By Necessity para criarem e/ou executarem planos de negócios. “É importante oferecer turmas específicas para LGBTQIA+ pois isso permite os alunos se sentirem mais à vontade para se expressarem, e há um reconhecimento entre eles sobre problemas e que são comuns. Além de apoio para empreender, eles encontram nesses espaços apoio emocional”, detalha Jéssica, que ressalta o alto engajamento e assiduidade dos participantes durante as aulas. 

Turma Arco-íris do projeto Empreenda Rio_2.png
Turma Arco-íris do projeto Empreenda Rio

Veia empreendedora e política

Um dos atendidos na turma carioca foi Pedro Henrique da Silva Miranda. Ele frequentou o curso oferecido nas dependências no Grupo Arco-íris (ONG que foi parceira nesta iniciativa), pensando em consolidar, gradualmente, o Nouvelle Lune, seu empreendimento pessoal.

Graduado em Comércio Exterior, Pedro Henrique tem pós-graduação em Administração, curso de despachante aduaneiro e é designer gráfico. Desempregado, ele busca uma recolocação no mercado e trabalhar para fortalecer seu negócio como forma de complementar a renda. Atualmente, é à venda de fones de ouvido sem fio e outros eletroeletrônicos que o profissional se dedica. As negociações acontecem especialmente via internet, e Pedro diz ter tirado lições importantes da capacitação oferecida pela Besouro, incluindo a necessidade de impor alguns limites aos clientes, como o horário de atendimento limitado.

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Pedro Henrique, um dos alunos da turma Arco-Íris

O Nouvelle Lune, no entanto, foi pensado originalmente como empreendimento dedicado à elaboração de estampas de camisetas criativas e exclusivas. Algumas de suas criações fizeram sucesso nas ruas, e o negócio também permite que Pedro apresente seu talento artístico.
 
Com relação à temática do orgulho LGBTQIA+, explica que foi em anos mais recentes que aprofundou conhecimentos e o engajamento com as pautas da comunidade. Filiou-se a um partido político e afirma que almeja ser, no futuro, uma nova Erika Hilton (deputada federal transsexual e ativista). Seu objetivo é ampliar a representatividade e a visibilidade LGBTQIA+ no âmbito político formal. “O que penso é que precisamos ser mais unidos. Recentemente, houve um momento em que todos diziam ´ninguém solta a mão de ninguém´, mas eu senti que todo mundo se soltou. Acho que precisamos chegar a um novo patamar. Por exemplo, se alguém consegue projeção numa empresa, acho que poderia – e seria justíssimo – ajudar mais gente da comunidade a ingressar no mercado também. O projeto de luta que existe, em si, é ótimo, maravilhoso, mas precisamos que ele aconteça na prática”, defende Pedro.
 


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