A arte de adoçar a vida
Valdelice realiza o sonho de seus clientes na forma de bolos artísticos e outros confeitos e almeja realizar, em breve, o seu: ensinar quem quiser seguir na área
No dia em que concedeu a entrevista para essa matéria, Valdelice Lídia Assunção Nascimento, 60 anos, elaborava o cardápio de Natal a ser oferecido pela sua empresa, a Wal Delícia’s Dreams, neste final de ano. Os “sonhos”, inseridos no nome do negócio, ela faz realidade na forma de bolos e outros confeitos (tão bonitos quanto saborosos). Na atividade, a empreendedora combina a sua paixão pela gastronomia com os interesses e os dotes adquiridos em relação ao artesanato, o que lhe permite oferecer iguarias que já contam com fãs contumazes, mas que ela pretende levar a mais e mais pessoas nos próximos anos.
Para isso, entende ser necessário qualificar a divulgação do trabalho, feita especialmente via WhatsApp e Instagram (confira aqui). Foi de olho nisso que Valdelice participou do Meu Trampo, programa de capacitação empreendedora da Prefeitura de São Paulo em parceria com a Besouro. “Achei o curso super maravilhoso e indico a outras pessoas para que aproveitem a oportunidade se abrirem novas vagas”, diz ela que, no momento, espera pela etapa pós-curso, de mentoria, em que aprofundará conhecimentos sobre o melhor emprego das novas mídias. “Já tiro boas fotos, mas há espaço para melhorar. As ideias que passam na minha cabeça, acredito, são melhores do que as que eu tenho visto por aí, mas ainda não consigo realizá-las, pois não domino a edição de vídeos, por exemplo”, pondera. Outra barreira a ser superada é a da timidez. Valdelice diz ainda ser desconfortável estar diante de câmeras para, por exemplo, mostrar como são os processos no seu trabalho.
A ampliação dos saberes sobre novas mídias será um ingrediente a mais para o sucesso da empreendedora, que adquiriu insumos indispensáveis à gestão de negócios ao longo de sua vida profissional. Por mais de duas décadas ela executou tarefas administrativas em uma empresa, e isso também lhe dá subsídios para conduzir o empreendimento próprio de melhor maneira.
Foi justamente a partir do desligamento do emprego com carteira assinada que nasceu oficialmente a Wal Delícia’s Dreams. Como para muitas outras pessoas, a pandemia de Covid-19 trouxe a sua demissão, em outubro de 2020. O momento foi ainda mais difícil porque, pouco antes, sua mãe falecera de câncer, num processo que exigiu muito de Valdelice (emocional, física e financeiramente). Ela buscou, então, na confeitaria, uma porta para sair do momento negativo. O potencial dos seus produtos já lhe era relativamente evidente porque empreender, mesmo que informalmente, permeou a sua vida desde cedo. “Meu pai faleceu quando eu nem havia nascido, e minha mãe, com quatro filhos, trabalhava muito pra sustentar a gente, pagar o aluguel, etc. Sempre gostei de artesanato, e comecei pintando panos de prato, entre outras coisas, ainda criança. Quando adolescente, passei a fazer docinhos, e aprendi a elaborar outras coisas, como pães de mel e trufas, e vendia essas coisas. Inclusive na empresa em que eu trabalhei depois”, relata Valdelice.
Dessa forma, ela sabia do sucesso de seus produtos entre quem os experimentava – as suas trufas, por exemplo, já tinham seguido aos Estados Unidos, à França e Itália, para serem servidos em festas e casamentos. Acho que há um tipo de alquimia na culinária. A de que quando você gosta de cozinhar, o seu amor passa para os doces, e as pessoas conseguem sentir isso”, amplia a empreendedora. Diante disso, Valdelice investiu parte do dinheiro proveniente da rescisão contratual em cursos para aperfeiçoar-se e na abertura de seu Microempreendimento Individual, mantido na residência que a confeiteira aluga no Campo Limpo, distrito da Zona Sul de São Paulo.
As metas de Valdelice incluem consolidar seu empreendimento para ela poder “passar menos tempo diante do fogão”, como define. A ideia é ter alguém para ajudá-la no atendimento aos pedidos e usar o tempo “livre” para ensinar a arte da confeitaria a outras pessoas, especialmente àquelas que estejam desalentadas. O desejo é o de levar o poder terapêutico que existe em confeitar a quem, como ela, em algum momento, ficou desamparado e sem saber o que fazer da vida. “Há espaço para todo mundo nesse ramo. Quero ensinar a confeitaria, mas também artesanato. Enfim, contribuir para as pessoas terem oportunidades, serem autossuficientes e desestressarem”, detalha.
Hoje, o artesanato se combina à confeitaria de Valdelice na decoração dos produtos em si, mas também nas embalagens que os acondicionam – o que agrega um viés sustentável ao empreendimento. Ela adorna latas e vidros que continham as matérias-primas utilizadas em sua cozinha para que sejam os recipientes em que coloca os doces que prepara.
No mês do Dia da Consciência Negra, Valdelice deixa como mensagem que todos, independentemente do que digam e façam, são capazes e filhos de um mesmo “Rei”. “Acho que é preciso que a gente fortaleça constantemente o nosso interior e lembre, sempre, de que Deus ama a todos sem distinções. Não devemos deixar ninguém tratar ninguém de maneira diferente. Precisamos nos valorizar e valorizar os trabalhos feitos pelos nossos ancestrais. Eu sou uma pessoa muito otimista e considero importante espalhar isso. Por exemplo, sou muito sorridente. Nem sempre eu estou feliz, mas quando entro num ônibus com um sorriso e dou um bom dia, isso faz com que as outras pessoas comecem a brilhar”, define.
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